29 de out. de 2012

Nada a perder


O mito da liberdade continua sendo o slogan preferido dos partidos políticos, das tendências da moda, dos conceitos publicitários, da tecnologia, das religões e dos relacionamentos. Mas na prática, infelizmente, a contra-adição quanto ao que "ser livre" significa é evidente. Ela, a liberdade, bradada por profetas milenares e heróis políticos não passa de uma ideologia. E enquanto existir nos reinos abstratos da mente humana não deixará de ser uma utopia. Para a sociedade moderna tudo começou, aparentemente, com o triunfo de uma economia baseada no mercado livre, a fim de limitar o poder do Estado. A partir daí, a fantasia de uma "sociedade" habitada por indivíduos livres se tornaria, finalmente, realidade. Mas na verdade, o que acontece é o oposto. 

Nunca fomos tão dependentes como hoje. No entanto, a idéia dominante de que, de fato, somos livres prevalece explícita. Por isso, a sociedade contemporânea parece experimentar uma ilusão libertária onde não só os governos, mas todas as formas de poder, agem constantemente para favorecer as suas próprias agendas. Segundo o economista James Buchanan, conselheiro político do governo Thatcher, contar com o interesse dos políticos não é suficiente para promover a liberdade, "pois no coração do homem encontra-se um modelo de comportamento paranóico e provido de medo, onde a elaboração de estratégias em favor de seus próprios interesses sempre prevalescerá". Não foi mera coincidência o fato da "sociedade" libertária de Thatcher, e outros defensores do atual sistema, ter se tornado insegura e problematizada; acorrentada a um sistema de risco. 

Não é mais novidade o fato "da mão invisível'' mencionada por Adam Smith, o pai da economia como disciplina científica, ter se tornado uma das maiores falácias da história. Apesar de ter a idéia de liberdade como a ideologia central de suas proposições progressistas, a liberdade progrediu como previlégio para uma minoria endinheirada. Não porque eram mais inteligentes mas porque, como a maioria prefere deixar de lado, o sistema econômico que habitamos é sustentado por trabalho escravo. Há quem defenda o atual sistema com unhas e dentes; geralmente aqueles que ainda estão por entender o que a palavra ética significa, e que ainda não se deram conta que, os mesmos, tem suas mentes subjugadas. 

A liberdade continua sendo um produto sedutor. Talvez seja essa a razão pela qual a mesma resultara na prisão moral do qual indivíduos, subjugados, não têm outra escolha a não ser obedecer. Ou seja, o caminho para a liberdade oferecida nas farmácias neoliberais nada mais é que a liberdade de construir a nossa própria prisão. Agora, confinados em um serviço impessoal regido por máquinas, um mercado impulsionado pelo lucro e, consequentemente, pela dívida, as pessoas se isolam mais e mais dentro de seus próprios mundos e prisões pessoais. Onde o individualismo exarcebado brada seu grito egóico de misericórdia proveniente dos lábios de uma liberdade cega. Onde, na melhor das hipóteses, indivíduos podem escapar tais prisões pelas mãos frias e imorais do consumismo; contruindo, assim, identidades artificiais. 

A liberdade, seja ela o que for, não deve ser "um estilo decadente onde tudo é sacrificado para o desenvolvimento de peças individuais". Como disse Karl Marx "nada temos a perder a não ser nossas próprias algemas". O importante é saber que o que enfrentamos não é uma marcha para a liberdade, mas um dilema ideológico. Ademais, sabemos muito bem como as ideologias trabalham sorrateiramente nas mentes; procurando impor o seu significado enquanto manipulam as pessoas. Por isso, o fato de sermos encorajados, constantemente, à liberdade está longe de nos tornar, de fato, livres. E o que é a liberdade se não uma ideologia pregada para manter soldados em campo de batalha, por uma causa que muitas vezes interessa apenas interesses tiranos? Nossos objetos já foram timbrados, nossos corpos codificados, mas ainda podemos manter uma mente autêntica; é por isso que devemos questionar tudo, sempre. E só assim poderemos então descobrir o verdadeiro significado dessa palavra; e mais ainda, vivenciá-la.

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